A Onça e o Ancião
Havia uma vez uma onça imponente que vivia sozinha nas montanhas de uma região remota. Com garras afiadas e rugidos que ecoavam pelas encostas, ela era temida por todos. Nenhum viajante ousava se aproximar de seu território — quem o fizesse, raramente saía ileso.
Durante anos, a onça reinou absoluta naquele silêncio selvagem. Mas o tempo passou… e algo mudou dentro dela.
O que antes era um refúgio se transformou em prisão. O silêncio que lhe dava segurança agora pesava como um fardo. Ela sentia-se só. Terrivelmente só.
Certa noite, envolta pela neblina e pela tristeza, a onça desceu até a margem do rio, onde vivia um velho ancião em uma cabana de madeira. Era conhecido por sua sabedoria, e a onça, vencida pela solidão, foi buscá-lo.
Aproximou-se silenciosa, mas sua presença não passou despercebida. O ancião, sentindo sua energia, abriu a porta devagar e a encarou. Seus olhos estavam cheios de paz. Sem ameaças, sem medo.
A onça rugiu, não em fúria — mas em dor.
— Preciso de conselhos — disse, com a voz embargada.
O ancião inclinou a cabeça, sereno:
— O que lhe aflige, criatura da floresta?
— Ninguém chega perto de mim. Todos me temem. Eu os ataquei, é verdade… Mas agora só quero companhia. Estou cansada de viver sozinha.
O ancião a ouviu em silêncio e respondeu com calma:
— Se quer que não tenham mais medo de você, precisa parar de atacá-los.
A onça assentiu com os olhos marejados. Voltou às montanhas e prometeu a si mesma que jamais atacaria outro ser.
E assim fez.
Nos dias que se seguiram, manteve suas garras retraídas e jamais rugiu. Esperava que a paz atraísse algum gesto de amizade. Mas o oposto aconteceu. Vendo que ela não reagia mais, algumas pessoas começaram a se aproximar — não com carinho, mas com pedras, lanças e paus.
A onça suportava os golpes em silêncio. Não queria quebrar sua promessa. Mas a cada dia ficava mais fraca, coberta de feridas, com os olhos apagando o brilho.
Até que, numa noite de chuva e trovões, o ancião subiu as trilhas até encontrá-la caída, respirando com dificuldade sob uma árvore retorcida pelo vento.
Ele se ajoelhou ao seu lado e perguntou, entristecido:
— O que houve com você?
Com um fio de voz, a onça respondeu:
— Fiz o que você disse… Não ataquei ninguém. E agora estou assim…
O ancião, com os olhos cheios de compaixão, disse com firmeza:
— Você entendeu errado, minha amiga. Eu disse para não atacar. Mas nunca disse para esconder suas garras ou calar seu rugido.
Ele tocou sua cabeça com delicadeza e continuou:
— Ser gentil não significa ser submissa. Você pode ser forte sem ser cruel. Pode se defender sem atacar. Mostrar suas garras não é ferir, é lembrar aos outros que você merece respeito.
A onça fechou os olhos. Pela primeira vez em muito tempo, sentiu-se compreendida.
Moral da história: Não é preciso ferir os outros para ser respeitado, mas também não se deve esconder sua força esperando que o mundo seja justo por conta própria. Há um equilíbrio necessário entre gentileza e firmeza. Ser amável não significa aceitar abusos. Mostrar suas garras — ou seja, seus limites, sua dignidade, sua força — é essencial para construir relações saudáveis e ser levado a sério.
Lembre-se: bondade não é fraqueza. Ser bom e ser forte podem — e devem — caminhar juntos.
.png)
Comentários
Postar um comentário